Ensaio Socio-etnográfico Capoeira Angola
Enviado por SaciiMx • 2 de Septiembre de 2012 • 102.078 Palabras (409 Páginas) • 535 Visitas
WALDELOIR REGO
CAPOEIRA ANGOLA
ensaio sócio-etnográfico
Salvador
Editora Itapoan
1968
Edição original
© Waldeloir Rego – Editora Itapoan, 1968 – In-8º de 417 páginas.
Direitos para a edição de 1968 concedidos a Editora Itapuã, Rua Padre Viera, 9, Salvador, Bahia, Brasil.
Impresso no Brasil nas oficinas da Companhia Gráfica Lux, rua Frei Caneca, 224, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Edição digital
Realizada devido a escassez de exemplares da edição original, para o uso privado do copista, também para poder aproveitar dos modos de pesquisa eletrónica. Escaneamento, digitação, codificação:
Pol Briand polbrian@mandinga.fr 1991-2005.
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Anexo: a proposto de Waldeloir Rego.
Artigos de jornais publicados na ocasião da morte do autor
Revisão html 7 dec 2005
I – A Vinda dos Escravos
1
II – O Termo Capoeira
17
Verbetes de dicionários
27
III – A Capoeira
30
IV – A Indumentária
43
V – O Jogo da Capoeira
47
VI – Toques e Golpes
58
VII – Os Instrumentos Musicais
70
VIII – O Canto
89
IX – Comentário às Cantigas
126
Léxico
141
Aspeto folclórico
216
Aspeto etnográfico
256
Aspeto sócio-histórico
257
X – Capoeiras Famosos e seu Comportamento na Comunidade Social
260
XI – As Academias de Capoeira
282
XII – Ascensão Social e Cultural da Capoeira
291
XIII – A Capoeira no Cinema e nos Palcos Teatrais
313
XIV – A Capoeira nas Artes Plásticas
324
XV – A Capoeira na Música Popular Brasileira
329
XVI – A Capoeira na Literatura
353
XVII – Mudanças Sócio-Etnográficas na Capoeira
359
Bibliografia
363
Índice das Matérias
393
Índice Remissivo
395
Capa de Emanoel Araújo com fotografia de Fernando Goldgaber
Ilustrações de Carybé
Obra publicada com a colaboração da Secretaria de Educação e Cultura do Governo do Estado da Bahia – Governador : Luiz Viana Filho – Secretário de Educação : Luís Navarro de Brito – 1968
Para os infinitamente amigos
Zélia Amado
Emanoel Araújo
1
I
A Vinda dos Escravos
E por demais sabido que durante a Idade Média os Portugueses, assim como outros povos, traficaram escravos, sobretudo negros. Há mesmo vagas notícias de uma parada aqui, outra acolá, porém a informação mais precisa, principalmente no que diz respeito ao tráfico de escravos africanos para o território português, é a fornecida por Azurara. O autor da Crônica do Descobrimento e Conquista da Guiné relata a maneira de como Antão Gonçalves, em 1441, capturou e trouxe para o Infante D. Henrique os primeiros escravos africanos. Relata também o cambalacho de Antão Gonçalves com Afonso Goterres, para importar esses negros do Rio de Ouro, cuja essência está neste trecho – Oo que fremoso aquecimento serya nós que viemos a esta terra por levar carrego de tam fraca mercadorya, acertamos agora em nossa dita de levar os primeiros cativos ante a presença do nosso principe!1
2
Isso foi a brecha para que o espírito de conquista do português o fiz levantar âncoras, para as terras de Africa, em busca de um novo comércio, fácil e rendoso, porém humilhante e desumano. A coisa tomou um rumo tal, que dentro em pouco, Lisboa e outras cidades já tinham um cheiro de cidade mulata. Em nossos dias o assunto tem preocupado estudiosos de todos os matizes e nacionalidades, como os lingüistas alemães Wilhelm Giese2, Carolina Michaëlis3 e nativos outros como Leite de Vasconcelos4 que, além de se manifestar sobre o tema, fornece uma bibliografia, em seu livro Etnografia Portuguesa , atualizada com notas de Orlando Ribeiro.
Na época, a presença de negros em Portugal mexeu com a imaginação poética dos trovadores do Cancioneiro Geral5 Gil Vicente6, Camões7, e mui especialmente Garcia de Resende que nasceu por volta de 1470 e morreu em 3 de fevereiro de 1536 e escreveu a sua curiosa Miscellanea e trovas do mesmo auctor & huma variedade de historia, custumes, casos & cousas que em tempo accõtescerã, publicada postumamente em 1554, apensa à Crónica d'el-Rei D. 3 João II. No decorrer de sua Miscelânea, satirizando sempre, fornece elementos sobre a façanha dos portugueses, nas bandas de África, os cativos tirados de lá para Portugal, seus costumes e outros fatos.
Na estância 48, mostra a fúria das conquistas: –
Rey & principe se vio
de Castella, & laa andou,
dij a pouco descobrio
ha India, & ha tomou,
como todo ho mundo ouuio,
tomando reynos, & terras
per muy guerreadas guerras
ganhãdo toda ha riqueza
do soldam & de Veneza,
sobjugando mares, serras.8
Nas estâncias 53 e 54, comenta a antropofagia dos negros da Guiné e Manicõgo, que é como grafavam antigamente o Congo, descoberto em 1485 por Diogo Cão: –
E começo em Guinee
& Manicõgo, por teer
costuma de se comer
hums a outros, como he
muy notorio se fazer.
cõprã homems como gaado
escolhidos, bem criados,
& matam hos regateiras,
& cozidos em caldeiras
hos comem tambem assados.
Por muito mais saborosa
carne das carnes ha temem
por melhor e mais gostosa,
4
mais tenra, doce, cheirosa,
que quantas na terra veem
nos que trazem a matar
nam ha chorar nem fallar,
mas como mãsos cordeiros
se deixam espedaçar.9
Nas estancias 56 e 57, fala de um costume fúnebre havido no desenlace do rei de Benin: –
Em Beni; de antigamente
tem por costume, por ley
matarem da nobre gente
& principal, que he presente,
qndo quer q morre ho rey
para la ho acompanharem
...