Letramentos E Alfabetizações Na Cibercultura: Crianças E Jovens Em Rede, Desafios Para Educação
Enviado por pacica • 2 de Julio de 2014 • 1.543 Palabras (7 Páginas) • 239 Visitas
Resumo: O artigo discute potenciais das tecnologias digitais e suas apropriações socioculturais
por crianças e jovens na contemporaneidade. Discute características do perfil cognitivo
do leitor imersivo, noções de letramento e alfabetização digital a partir de revisão de
literatura e de um caso empírico vivenciado pelas autoras. Por fim, apresenta os potenciais
das tecnologias digitais, mais especificamente o uso de ambientes virtuais de aprendizagem
(avas), para a instituição de práticas curriculares e formativas. Os ambientes virtuais de
aprendizagem permitem a convergência de linguagens e mídias, o que pode potencializar
práticas de letramentos e alfabetização em situações formais de aprendizagem e formação,
uma vez que crianças e jovens já se apropriam direta ou indiretamente de tais potenciais.
Palavras-chave: Letramento; cibercultura; educação.
A cena contemporânea
Nossa cultura contemporânea é constituída essencialmente hoje pela emergência
do ciberespaço, meio de comunicação surgido a partir da conexão mundial
dos computadores (Lévy, 2005) e visto como uma dimensão da sociedade em
rede, na qual fluxos de informações (Castells, 2010) delineiam novas formas de
relações: econômicas, sociais, profissionais, políticas, educacionais, trazendo novos
contornos à sociedade. Vivenciamos uma nova relação entre o que chamamos de
“tecnologias digitais em rede” e os processos de comunicação, potencializados pelos
usos dos dispositivos móveis, redimensionando os espaços urbanos.
Compreendemos assim que, “em sua fase atual, a cibercultura vem se caracterizando
pela emergência da mobilidade ubíqua em conectividade com o ciberespaço e as
cidades” (Santos, 2012, n.p.). É no contexto do surgimento de um novo sistema social
que pretendemos discutir os usos de novas linguagens, novas formas de comunicar e
novos contextos de comunicação e educação que exigem dos cidadãos novas destrezas
e habilidades, a fim de terem garantidas plenas possibilidades de participação social.
A relação entre o homem e o conhecimento se dá através da mediação de múltiplas
linguagens, sendo estas constituintes da cultura e por ela constituídas, ao longo
da história. Os meios e as formas de comunicar de nossa sociedade, a entrada do
digital em rede na escola, e sua apropriação por parte de crianças e adolescentes,
impelem a instituição escolar a fomentar não somente a tradicional alfabetização,
processo de formação essencialmente de leitores do tipo contemplativo ou movente,
mas também o letramento digital, contemplado pela educação do leitor imersivo
(Santaella, 2009), como discutiremos a seguir.
Alfabetização e letramento digital não se constituem como processos distintos
ou conceitos que se relacionam hierarquicamente entre si, pois os tipos de leitores – contemplativo, movente e imersivo – coexistem (ver Figura 01, adiante). O letramento
digital é um elemento do contexto de uma alfabetização múltipla e consiste
em favorecer aprendizagens sobre a tecnologia digital e as linguagens multimídia,
para que a educação possa contemplar sua finalidade como ferramenta de transformação
social.
Situamos a necessidade emergente de uma intervenção nos usos do digital
em rede na escola como parte de um planejamento adequado à gestão pedagógica
da sala de aula, considerando que o processo educativo nas escolas de educação
básica não se limita ao ensino de conteúdos, habilidades e competências, abrange
igualmente o currículo oculto4. Dessa constatação decorre o fato de que, mesmo
sem uma intervenção pedagógica nos usos do digital em rede pela escola, os alunos
se apropriam desse digital, principalmente pelo uso de celular em sala de aula,
como o ocorrido em uma escola particular da zona do sul do Rio de Janeiro, onde,
surpreendidos por um fato inusitado, uma fotonovela no Orkut5, a dinâmica da
escola foi alterada.
O Orkut e os usos do digital em rede na sala de aula
Estudantes do oitavo ano do Ensino Fundamental ii capturaram com um telefone
celular cenas de seu cotidiano escolar, sem o conhecimento da direção da instituição.
Fizeram registros de professores em sala de aula acompanhados de estudantes
não muito entusiasmados, fazendo, em algumas fotos, um gesto obsceno para algum
professor. Muitas fotos anunciavam “uma bagunça em sala de aula”. Registraram
também uma foto de uma aluna sentada na sala da direção tendo uma “conversa”
com a diretora. Após concluírem os registros fotográficos, utilizaram as fotos para
criar uma espécie de fotonovela, com uma sequência de fotos e textos narrativos.
Para expor a fotonovela, utilizaram como veículo o Orkut de um dos estudantes.
A captura, apropriação e tratamento dessas imagens, por meio do celular, revelam
o uso do aparelho como, tal qual o definiu Lemos (2007), um “teletudo”,
equipamento indispensável nas mochilas de todos os adolescentes, constituindo-
se efetivamente como um centro de comunicação, potencializando a ação de seus usuários. Percebemos aqui os usos do celular como uma forma de subverter
os limites da escola; o mergulho no cotidiano nos mostra as artes de fazer: usos e
táticas6 desenvolvidas pelos praticantes, que têm como característica suas astúcias,
formas de driblar o que é ou está instituído.
Disponíveis no Orkut, as imagens tornaram-se assunto na escola, chegando ao
conhecimento também de alguns responsáveis. O acesso às imagens se deu pelo
aviso de dois estudantes da própria turma que, retratados na “fotonovela”, se sentiram
invadidos em sua privacidade. O uso do celular na escola para registrar imagens
cotidianas traz novas questões em relação ao espaço público e espaço privado, ocasionando
mudanças a partir dos usos de dispositivos móveis,
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