Literatura Infantil
Enviado por lorrane_dsp • 7 de Abril de 2014 • 3.439 Palabras (14 Páginas) • 334 Visitas
Literatura infantil: origens, visões da infância e certos traços populares
Numerosos estudiosos têm partido do pressuposto de que só se pode, realmente, falar em literatura infantil a partir do século XVII, época da reorganização do ensino e da fundação do sistema educacional burguês. Segundo essa linha de pensamento, antes disso e em resumo, não haveria propriamente uma infância no sentido que conhecemos. Antes disso, as crianças, vistas como adultos em miniatura, participavam, desde a mais tenra idade, da vida adulta. Não havendo livros, nem histórias dirigidas especificamente a elas, não existiria nada que pudesse ser chamado de literatura infantil. Por este viés, as origens da literatura infantil estariam nos livros publicados a partir dessa época, preparados especialmente para crianças com intuito pedagógico, utilizados como instrumento época, preparados especialmente para crianças com intuito pedagógico, utilizados como instrumento de apoio ao ensino. Como consequência natural deste processo, o didatismo e o conservadorismo (a escola, afinal, costuma ser instrumento de transmissão dos valores vigentes) deveriam ser considerados componentes estruturais, por assim dizer, da chamada literatura para crianças.
Com pretexto de reconstituir a história da literatura infantil, Denise Escarpit inicia seu trabalho já no séc. XVII, apontando quais teriam sido os primeiros livros para crianças. Cita, como exemplo, o trabalho Orbis Sensualium Pictus (1658), de Comenius, obra criada com o intuito de ensinar latim através de gravuras, um antepassado, sem dúvida, do nosso livro didático ilustrado para crianças. Antes do século XVII, afirma Escarpit, não existiria nada que pudesse ser tratado como literatura infantil. A pesquisadora francesa, entretanto, não deixa de mencionar diversas atividades expressivas e populares como as adivinhas, rimas infantis e certos jogos de palavras que, segundo ela, fariam parte da gênese da literatura infantil.
A autora refere-se às narrativas populares, por ex. fabula (narrativas breves, alegres, anônimas, em geral abordando pequenos casos da vida cotidiana – adultérios, espertezas etc. muito populares no período medieval.); contos maravilhosos (de fadas ou de encantamento); fábulas; lendas etc., frisando que, basicamente, eram dirigidos a adultos e contados por adultos. Faz ainda uma interessante associação entre a cultura popular, o que era produzido pelo e para o povo, e o que era oferecido às crianças. Diz textualmente Denise Escarpit que, neste período.
Sobre um certo “universo infantil”
Classificações usuais como “infantil” e “juvenil”, podem, naturalmente, ser úteis em determinadas situações (por exemplo, as mercadológicas), mas, convenhamos, parecem bastante imprecisas. “Infantil” indica crianças. Mas, que crianças? De três, cinco, sete, nove ou onze anos?
Alfabetizadas ou não? É possível tratar uma pessoa de sete da mesma forma que tratamos uma de nove? Um livro para uma criança de oito anos agradaria a uma de dez?
Para alguns, pessoas de onze anos já não seriam crianças mas sim adolescentes, portanto caracterizáveis como “juvenis”. Mas o que seria “juvenil”? Jovens de onze, de treze ou de quinze? É possível tratar um jovem de onze da mesma forma com que tratamos um de quinze? Quais os pontos comuns e as diferenças entre um jovem de treze e uma criança de nove anos? Seriam duas pessoas de treze anos iguais?
Questionamentos deste tipo têm, na verdade, algum cabimento?
Considerando a literatura, a motivação estética, o discurso ficcional, poético e não utilitário, faz sentido falar em livros dirigidos a determinadas faixas etárias? Seria válido dividir a complexa realidade humana, matéria prima da arte, em abstratos grupos de idade? É possível tratar a infância como uma massa homogênea de pessoas? Para determinar graus de escolaridade talvez sim, mas para falar em experiência existencial?
No caso dos livros didáticos, a divisão dos assuntos em faixas etárias parece ser um procedimento bastante razoável. Pensamos no conteúdo de determinada matéria, com contornos nítidos, organizado num grau crescente de dificuldades, dividido em tantos anos letivos, transmitido de forma objetiva a indivíduos com, mais ou menos, as mesmas características e no mesmo estágio físico e neurológico.
A visão que temos hoje do que seja criança é ligada, naturalmente, ao nosso contexto histórico, social, científico (epistemológico) e cultural. Estamos habituados a conviver, pelo menos em certas classes sociais, com uma infância apartada da vida adulta (do trabalho, da sexualidade, da política etc), habitando um universo delimitado por assuntos escolares, certo vocabulário, certas brincadeiras e certos assuntos. Em outras épocas, existiram outras crianças, tratadas de outras formas ocupando outros espaços dentro da família e da sociedade.
De momento, em todo o caso, o que nos interessa são principalmente os seguintes ponto:
1) se levada a sério, a noção de que existem dois universos líquidos e certos separando crianças e adultos irá, fatalmente, nos levar a determinado tipo de literatura infantil.
2) se considerarmos que adultos e crianças compartilham, em linhas gerais, um mesmo
universo, com certeza teremos outra literatura infantil, a nosso ver infinitamente mais rica e complexa e humana.
3) Vínculos entre o conto popular e a literatura infantil:
Vale a pena tentar apontar alguns pontos que, em nossa visão, poderiam aproximar as narrativas populares da literatura para crianças.
No plano da expressão, do discurso (ou do significante), sabemos que os contos populares sobreviveram ao longo dos séculos de boca em boca, transmitidos por bardos, menestréis e contadores de histórias. Estes, invariavelmente, recorriam a um discurso conciso, a uma linguagem marcada pela expressão oral, fórmulas verbais pré-fabricadas, ditados, frases feitas e a um vocabulário popular e acessível, tendo em vista a comunicação clara e direta com a plateia 14.
Encontraremos situação análoga na maioria absoluta das obras destinadas ao público infantil: textos concisos, marcados pela oralidade, utilizando vocabulário familiar e construídos com a intenção de entrar em contato com o leitor.
Da mesma forma, no plano do conteúdo, muitos pontos de contato unem os contos populares à literatura infantil. Vamos enumerar apenas alguns deles:
1. A recorrência do elemento cômico. O riso, o deboche, a alegria e o escárnio como revide aos paradoxos contrapostos pela existência;
2. O uso singularmente livre da fantasia e da ficção, muitas vezes como forma de verificação ou experimentação da verdade;
Estes dois primeiros itens, para Mikhail
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